UMA NOTA QUE PODERIA TER SIDO BEM MELHOR
Portugal caiu aos pés da Espanha. Ficou-se, no Mundial 2010, pelos oitavos-de-final. Para nós, adeptos, é pouco. Seria sempre. Por aquilo que a selecção portuguesa fez na sua última participação, em 2006, também é reduzido. Pelo historial de participações nacionais, onde Portugal chegara duas vezes às meias-finais e ficara outras duas na fase de grupos, é um meio-termo. Está longe de ser bom mas também não é mau de todo. É suficiente. A eliminação, apesar de dolorosa, não surpreendeu. A Espanha é mais forte, mais pujante e mais candidata. O jogo de terça-feira comprovou-o: os espanhóis foram mais incisivos, dominaram mais, estiveram mais tempo por cima, foram mais discernidos. E mais ousados. A principal diferença esteve aí: a Portugal faltou audácia para chegar mais além.

Classificarmos a participação portuguesa como desastrada é demasiado redutor. Só quem tivesse verdadeiramente esperanças em como Portugal poderia vencer o Mundial, ou ficar lá perto, assim poderá pensar. Eu, como o leitor pode comprovar pelas crónicas anteriores, fui sempre muito realista. O objectivo, antes de nos centrarmos em estabelecer metas arriscadas, deveria estar na passagem aos oitavos-de-final. Ficar na fase de grupos, apesar de ter Brasil e Costa do Marfim como adversários, seria, aí sim, uma verdadeira desilusão. Portugal conseguiu-o. Não foi brilhante mas cumpridor: empatou com os rivais mais fortes, sendo muito consistente defensivamente e cauteloso no ataque, e ganhou com uma goleada, histórica e eficaz, à frágil Coreia do Norte. A meta principal ficou cumprida. A partir daí, com ambição e audácia, Portugal deveria encarar o jogo dos oitavos-de-final fortalecido e confiando nas suas capacidades. Sem nunca se colocar em bicos de pés.
Nestas coisas de futebol há quem confunda ambição com convencimento. Ter ambição mostra a vontade de querer chegar longe, a alma, a garra que está presente em cada jogo. A selecção portuguesa, porque é uma equipa composta por jogadores de qualidade, deveria ser ambiciosa. Acreditar que, com suor e sacrifício, poderia seguir em frente. Convencimento é algo completamente diferente. Passa, no fundo, por entender que, antes de qualquer jogo ser realizado, a equipa já está com um pé na fase seguinte. Resulta de uma ambição desmedida, sem regras. Portugal deveria ter ambição, muita, mas nenhum convencimento. Juntar duas partes essenciais: ter ambição e cuidados, ser ousada e cautelosa, fazer tudo para ganhar sem colocar em perigo a sua defesa, arriscar sem cometer suicídio.
A conclusão é fácil: Carlos Queiroz não encontrou a velocidade certa, no ponto médio, para guiar a armada portuguesa. O seleccionador foi sempre cauteloso, expectante, defensivo, resguardando-se dos adversários mais fortes. A selecção portuguesa esperou sempre para perceber as intenções dos rivais. Se atacassem, tudo bem, a defesa estava preparada. Aí, nesse aspecto, resultou lindamente: em quatro jogos, Eduardo, uma figura portentosa de Portugal na África do Sul, sofreu um golo. Mas é necessário, aliando a uma barreira defensiva forte, atacar. Ninguém pode ganhar sem marcar. Defender bem é a primeira premissa do sucesso, atacar com inteligência, rapidez e ousadia é a outra. A Portugal, para ser bem-sucedido, faltou o segundo ponto. Como seria possível, em jogos a eliminar, conseguir o objectivo sem atacar?
O jogo com a Espanha deixou um amargo de boca - primeiro por ter sido com os espanhóis, sim. A selecção espanhola, naquele estilo à Barcelona, circula a bola, fá-la rodar por todos os jogadores, passa, repassa e volta a passar. Parece um ciclo vicioso. Jogam bem, com qualidade, têm jogadores, como a dupla cerebral Xavi-Iniesta e o matador David Villa, de enorme valia. Mas, apesar de tudo isso, Portugal poderia ter ganho. Se, lá está!, fosse mais atrevido e mais corajoso. Tivemos oportunidades, assustamos Casillas, os defesas espanhóis viram-se em perigo. O ímpeto de La Roja, a tal fúria, foi enfraquecida por Portugal. Faltou, voltamos ao início, arriscar no ataque. Partir para cimar da Espanha, obrigar a errar, encher o peito e lutar até ao final. Portugal, por certo, quis ganhar. Só que fez pouco por isso.
O minuto cinquenta e sete marcará o jogo: Queiroz tirou Hugo Almeida, o ponta-de-lança, ao mesmo tempo que Vicente Del Bosque, conhecedor e matreiro, colocou Llorente, uma estaca, junto aos centrais portugueses. Portugal morreu aí. O seleccionador português errou. O seu plano de contenção resultara bem, a selecção portuguesa vivia o seu melhor período, conseguira afastar o perigo espanhol e chegar à baliza de Casillas. Importava, mais do que tudo, manter-se assim e, sem comprometer todo o trabalho realizado até então, aumentar esse ritmo ofensivo. Mas Portugal, pelo contrário, encolheu-se. Ao mesmo tempo que a Espanha cresceu e marcou. Em vantagem, começou a circular a bola, tiki-taka, jogando com o relógio. O resultado estava entregue. Tal como Portugal.
A selecção portuguesa foi como um aluno em exame. Nervosa, jogando pela certa, cumprindo os serviços mínimos. Ultrapassou comodamente a barreira negativa, representada pela saída no final da fase de grupos, mas ficou-se pelo satisfaz. Ronda os cinquenta por cento. Foi um aluno que se preocupou apenas em transitar para a próxima etapa, tendo mais de metade da cotação, não sendo ambicioso para chegar ao topo da escala e superar as suas próprias expectativas. O professor Carlos Queiroz, com responsabilidades, é culpado por não ter incutido essa vontade na sua turma. Até o aluno com melhores créditos, de quem mais se esperava, desiludiu. Foi um entre tantos. Não sobressaiu. De Cristiano Ronaldo, o tal aluno mais talentoso, nada se viu na África do Sul.

O Queiroz pelos vistos vai continuar, só espero que mude de atitude, para bem do nosso futebol.