WE ARE THE CHAMPIONS, MY FRIEND!


Freddie Mercury sobe ao palco. Com aquela irreverência, com aqueles fatos justinhos, com o bigode que o caracteriza. Enche os pulmões, dá um gole no hiper-copo que tem em cima do piano, prepara-se para arrasar. Respira fundo e siga!. A música começa. Chega o clímax quando entooa, com toda a força, deixando tudo num só sentimento, we are the champions. Data já de meados de oitenta, as imagens parecem actuais, parece tudo de ontem, tinha tudo para ser actual. Não sei qual foi a intenção de Freddie Mercury quando escreveu a música. Podia não ser nenhuma. Mas, sinceramente, não acredito. As músicas dos Queen, além do impacto, tinham simbolismo. Esta pode ser dedicada a quem sempre duvidou, quem não esperaria sucesso vindo dali, quem julgaria ter maiores capacidades. We are the champions e as dúvidas desfazem-se sobre quem é mesmo o melhor. Se a ideia era essa, José Mourinho podia ter feito de Freddie Mercury.

Martin Atkinson levanta a placa com o número três. São os minutos que faltam para o Internazionale de Milão ser coroado, quarenta e cinco anos depois, com José Mourinho no lugar do mítico Helenio Herrera, campeão europeu. Diego Alberto Milito, um avançado argentino de trinta anos, tardiamente surgido na ribalta mas bem a tempo de deixar uma marca sentida na História, fizera dois golos. Dois golpes letais, carregados de cinismo e veneno, no Bayern de Munique. Mourinho deixa a área técnica, está mais calmo, o segundo tento de Milito fez descarregar toda aquela adrenalina, a ânsia que o consumia, para dar tranquilidade final. Fora o golpe de misericórdia nos alemães. Estavam recolhidos, vergados, rendidos. Como Van Gaal. O mestre, um dos ensinadores de Mou, afundado naquele banco do Bernabéu. Mourinho foi lá, deu um abraço, confortou o frio holandês. Deve ter agradecido o que aprendeu mas agora só ele tem real importância.

Mourinho ergue os braços, festeja, deixa que a glória se espalhe em si. I'm a special one and we are the champions, my friend! O friend pode ser Louis Van Gaal, o mestre que arriscou fazer jogo psicológico com o aprendiz antes da partida, como se fosse há dez anos atrás, tentando perceber se tinha ainda alguma influência. Mourinho é, agora, o verdadeiro artista dos mind-games, começa a ganhar os jogos sem jogar, tem poder para diminuir o adversário e desprezá-lo com as suas palavras. Como fez, por exemplo, com Claudio Ranieri, o treinador que se aborrece ao ouvi-lo. Também podia ser um bom friend na lista de dedicatórias. Nesse grupo de derrotados com a vitória de Mou estarão, no fundo, todos os cépticos, todos os que ousaram criticá-lo antes de tempo, apresentando-o como um treinador normal. Normal é aquilo que Mourinho nunca será. Seja pelos títulos que conquista, seja pela postura que manterá eternamente.

Howard Webb apita pela última vez em Madrid. Os jogadores do Inter explodem de alegria. Diego Milito está imortalizado pelos golos, Esteban Cambiasso por tudo aquilo que jogou, Javier Zanetti pela força de quem tem trinta e seis anos e parece ter vinte, Júlio César pelas assombrosas defesas que deixaram o Bayern à porta dos festejos. Mourinho está emocionado, ultrapassou tudo, reconquistou a Liga dos Campeões que ganhara há seis anos, ficou feito o triplete, juntando-se o campeonato e a Taça de Itália. Abraça um, dois e três, Balotelli pelo meio, porque é hora de comemorar. Abraça Massimo Moratti. É um obrigado e até sempre. Ambos estão agradecidos. Moratti imitiou o pai, devolveu o Inter à glória europeia quase meio século depois, o seu clube ganhou a dimensão que, apesar de dominador em Itália, lhe faltava na Europa. Mourinho, já se sabe, cumpriu o seu trabalho. Aqueles que disseram que foi exclusivamente contratado para vencer a Liga dos Campeões ficaram ser argumentos. O triplete é mais forte do que tudo.

Quem é odiado agora, é odiado para sempre. Não há pausas para tréguas, tempos mortos, clima de guerrilha menos intenso. A cruzada dos italianos com Mourinho, ou de Mourinho com os italianos, há-de manter-se para sempre. A conquista da Liga dos Campeões deveria ter servido para pôr uma pedra sobre o assunto. O Inter ganhou internamente e ganhou a Europa. Mourinho irá embora feliz da vida - Parabéns, pá! Tiveste mérito, ganhaste, nós metemos a viola ao saco e agora vai lá à tua vida. Nada disso. Continua criticado: o futebol do Inter é defensivo, nada encantador, abusa do pragmatismo, monta uma fortaleza na defesa e decide, com malvadez, nos momentos letais. Não é bonito se de se ver, claro que não. Mas dá frutos. Isso supera qualquer estética. Ganhar o triplete onde ninguém o queria foi ouro sobre azul, foi vencer em terreno hostil. Também Freddie Mercury não era apreciado por todos. E ficará, para sempre, na História. Há algo que o une a Mourinho: sabe o que é? A glória!

5 Response to "WE ARE THE CHAMPIONS, MY FRIEND!"

  1. André terça-feira, maio 25, 2010
    Um enorme feito de Mourinho.
    Todo o seu sucesso e mediatismo é merecido.
    Boa crónica Ricardo, parabéns ;)
  2. Anónimo terça-feira, maio 25, 2010
    Para o Van Gaal deve ter sido um orgulho disputar uma final com o seu "aluno", agora ser vencido por ele, deve ser cá uma azia lol
  3. André terça-feira, maio 25, 2010
    Eu acho que bem lá no fundo também deve sentir orgulho ;)
  4. Mário terça-feira, maio 25, 2010
    Não tenho nenhuma dúvida ao afirmar que vai tornar-se o melhor treinador da história do futebol, o que Mourinho faz é épico.
    Boa crónica Ricardo.
  5. João Nunes quinta-feira, maio 27, 2010
    No Real Madrid o Mourinho vai tocar no céu, falta-lhe muito pouco para ser o melhor de sempre, espero que o consiga no Real.
    Boa crónica.